Quando li, pela primeira vez, o conto "O Espelho", de Machado de Assis, o primeiro pensamento que foi ativado à minha mente foi "esse caba só pode ter comido banana com maconha estragada!" Entretanto, minha leitura rápida, cansada, apenas com decodificação superficial, preocupada com os elementos linguísticos e teóricos da gramática e literatura, não me permitiu abundar em reflexões acerca da "nova teoria da alma humana" da qual Machado de Assis tratou com a criação do protagonista Jacobina.
Na narrativa, Jacobina, conversando com os "quatro ou cinco cavalheiros", trata da sua teoria, ao afirmar que o ser humano não possui apenas uma, mas duas almas: uma que olha de dentro para fora, e outra que olha de fora para dentro. Mas calma, não se assuste também... Vou explicar: A primeira é a alma interior, conhecemos a existência dessa! A segunda é que complica, é a alma exterior; o personagem do conto explica:
"A alma exterior pode ser um espírito, um fluido, um homem, muitos homens, um objeto, uma operação. Há casos, por exemplo, em que um simples botão de camisa é a alma exterior de uma pessoa; - e assim também a polca, o voltarete, um livro, uma máquina, um par de botas, uma cavatina, um tambor, etc. Está claro que o ofício dessa segunda alma é transmitir a vida, como a primeira; as duas completam o homem, que é, metafisicamente falando, uma laranja. Quem perde uma das metades, perde naturalmente metade da existência; e casos há, não raros, em que a perda da alma exterior implica a da existência inteira.”
Para mostrar o tanto que essa teoria é verdadeira, citarei exemplos de acontecimentos em que percebemos a força que essa teoria tem em nosso dia-a-dia:
Quando se está apressadíssima se arrumando para um evento, e, indo-se para o carro, já pronta, algum móvel da casa por onde a pessoa passa correndo, prende o botão da roupa, fazendo-o cair... A vontade que dá é de quebrar, primeiramente, o móvel que estava ali, e em seguida, a pessoa que estava no carro buzinando desesperadamente! A partir daí, a noite já não se mostra tão boa! Pois era naquela roupa em que se tinha posto tanta expectativa ao comprá-la um dia antes do evento, pré-estabelecendo seu uso para o evento. E foi exatamente daquele botão caído, em específico, que foi retirado o ânimo para a noite.
Quando se está cabisbaixo, preocupado com tantos afazeres, porém inerte, e recebendo o convite de algum amigo para ir ao melhor restaurante da cidade, comer do prato preferido, a pessoa dá-se por satisfeito; aquele prato de camarão trouxe mais significado, naquele momento, do que os problemas da vida!
Nessas e em tantas outras situações, aparentemente cômicas, percebemos a materialização que essa alma exterior, afirmada no conto, é comum e forte! Uma especificidade minúscula de contrariedade às próprias expectativas e vontades é capaz de tornar frustrado um momento (demorado ou não). Ou ainda, uma especificidade minúscula de natureza prazerosa é capaz de inverter para boa a situação que se mostrava em péssimo contexto de conforto. A alma exterior, como é tratada no conto, modifica a alma interior.
Portanto, o ser humano é cheio de inconstâncias! Todavia, sabemos que existem duas vertentes para essa teoria: é bom sermos aquela metamorfose ambulante, e, de fato, somos! Até porque não somos robôs... Mas, a outra vertente é a oscilação exagerada de humor por momentos, através de expectativas exageradas!
Enfim, tiro o chapéu para Machado de Assis, por ser capaz de trazer à tona tantas reflexões acerca de um milésimo de existência da alma humana, visto que o maior Autor/Artista é Aquele capaz de sondar e entender, melhor que nós mesmos, nossos anseios, vontades, erros, acertos, detalhes, sendo capaz, ainda, de nos amar e querer o melhor para nós, independente de tudo isso! ;)
Karol Guedes
cri cri cri
ResponderExcluirkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkk
ResponderExcluiré verdade karolzinha
Minha querida prima, vejo que começa a enveredar pelas obras esplendorosas daquele que, para mim, foi de longe o maior escritor que esse país já teve. Machado consegue desmascarar, como nenhum outro, a natureza não raras vezes torpe do ser humano, o que definitivamente nos faz questionar as nossas próprias atitudes para com os outros e para com nós mesmos. Um sorriso sempre brota no meu rosto a cada conto ou romance lido. Para mim suas obras são a mais pura expressão do autoconhecimento. Beijo enorme, Ananda.
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